Fogo e desinformação: produtores rurais superam prejuízos deixados pelas queimadas e fake news

Fogo e desinformação: produtores rurais superam prejuízos deixados pelas queimadas e fake news

Devastador. Essa é a palavra que a produtora rural Fernanda  Carvalho  utiliza para definir o período de queimadas que reduziu a cinzas os meses de trabalho nos 1 mil hectares da família. Experientes pecuaristas e produtores de cana-de-açúcar e soja, os Figueiredo de Carvalho nunca enfrentaram incêndios na proporção dos que atingiram a propriedade em 2024.

Em meio às chamas, todos se arriscaram para tentar conter o avanço do fogo, que varreu plantações e criações, deixando um rastro de destruição. “Não tem como explicar o que sentimos. Todo mundo ajudando, se colocando em risco para tentar resolver, mas era incontrolável”, relembra.

Só no mês de agosto, quando o fogo atingiu as terras da família nos munícipios de Cajuru (SP) e Santa Rosa de Viterbo (SP), o Brasil registrou 5,65 milhões de hectares queimados, de acordo com levantamento do Monitor do Fogo MapBiomas. A área é 149% maior que do a que foi atingida por incêndios no mesmo período do ano anterior.

No estado de São Paulo, as chamas atingiram predominantemente áreas agropecuárias (88,7%), assim como a propriedade da família de Fernanda. Ao todo, de janeiro até agosto, 236 mil hectares de cana-de-açúcar foram destruídos pelo fogo.

Área devastada pelo fogo na propriedade de Fernanda Carvalho

Enfrentando um dos piores cenários da história do agro brasileiro, com índices recordes de queimadas, estiagem intensa e prejuízos severos, os produtores se viram lutando não apenas para reconquistar o que foi perdido, mas para desmistificar uma narrativa que ganhou força: a de que eles próprios foram os responsáveis pelos incêndios.

“O que mais assustava era justamente ouvir pessoas falando que foi o próprio produtor que colocou fogo. Isso é uma coisa que não tem cabimento, porque é um sofrimento absurdo, tanto pessoal quanto financeiro”, enfatiza Fernanda, destacando que as queimadas sem precedentes em nada beneficiaram os negócios da família. Muito pelo contrário, o fogo acarretou uma série de prejuízos como a danificação do solo, a perda de produção, a morte de parte do rebanho e a falta de pastagem para as criações que sobreviveram. “O impacto foi muito grande”, completa.

Quatro meses após as queimadas, a família ainda se recupera dos prejuízos econômicos e psicológicos causados pelas chamas e pela desinformação. Cooperados da Sicoob Cocred desde 2008, os Figueiredo de Carvalho sabem que podem contar com o apoio da cooperativa – que tem 55 anos de expertise no campo e nasceu justamente com o objetivo de apoiar os produtores rurais – para se reerguer. O solo coberto por cinzas, registrado em fotos por Fernanda, contrasta com o cenário atual da propriedade. O verde das primeiras mudas de soja germinadas simboliza a esperança de um 2025 melhor, mais próspero e seguro. “Esperamos nunca mais passar por tudo isso novamente”, diz a produtora rural.

Fernanda Carvalho, cooperada da Cocred desde 2008

Prejuízo na indústria

Administrador da Usina Bazan, localizada em Sertãozinho (SP), um dos municípios mais afetados pelas queimadas entre junho e agosto, Wagner Pereira dos Santos também foi testemunha do impacto do fogo e da mobilização para combatê-lo. Referência no interior paulista em produção de aguardente, etanol e açúcar, a Bazan calcula que as perdas cheguem a R$ 34 milhões.

Mas apesar do saldo econômico negativo, Santos analisa com otimismo o trabalho conjunto dos 124 brigadistas, 27 caminhões-pipa e nove caminhonetes de apoio, que impediu um prejuízo ainda maior tanto na unidade quanto nas propriedades vizinhas. Resultado de um investimento consistente em prevenção e contenção das chamas, haja vista o aumento de casos nos últimos anos.

“A nossa equipe de brigadistas trabalha 24 horas por dia, mas enfrentamos muitos focos de incêndio ao mesmo tempo. Mesmo com todos os recursos, a intensidade do fogo superou e causou todo esse prejuízo. O fogo não poupou nada: cana plantada, em formação e até as que seriam colhidas só em dezembro”, diz Santos, destacando que as usinas também foram apontadas como causadoras das queimadas. Uma falácia que foi embasada na técnica ultrapassada denominada queima controlada.

“Todos os cultivos foram adaptados com tecnologias para que a gente não precise mais dessa prática. São anos de mudanças e de preparação para que o fogo fosse substituído enquanto técnica. Essas falas que colocam a culpa nos produtores são mal intencionadas”, desabafa o administrador da usina, com mais de 20 anos de experiência no setor sucroenergético.

Brigadista atuando na Usina Bazan em Pontal

Queima controlada

“Você colocaria fogo no seu patrimônio?”. O questionamento que circula na internet, principalmente em portais do agronegócio, levanta uma reflexão fundamental diante da situação que impactou não só o agro, mas toda a população que também foi afetada pela fumaça e poluição das queimadas. Afinal, por que as pessoas ainda acreditam que produtores de cana e usinas de açúcar e etanol se beneficiam das queimadas? Qual seria o interesse do segmento ao ver o seu próprio trabalho e esforço, durante meses ou até anos, virar pó?

Muito antes da mecanização da colheita e da consolidação de técnicas modernas de manejo, o fogo era utilizado para limpar as folhas secas e verdes, deixando a cana limpa e adequada para ser cortada manualmente, e então ser transportada e moída. Quando se recorria às queimadas, era preciso finalizar a colheita em até 72 horas, uma vez que o fogo também acelera o processo de deterioração da planta, bem como o aparecimento de fungos e bactérias. Mas, atualmente, 100% da colheita de cana no estado de São Paulo é mecanizada, sem a necessidade dessa técnica de manejo.

Em 2024, sem a prontidão de trabalhadores preparados para continuar a colheita e, em muitos casos, sem que as plantações estivessem no período adequado para colher, os incêndios pegaram muitos produtores de surpresa e causaram perdas significativas de qualidade da cana, inviabilizando o uso em determinados processos industriais, como a produção de açúcar. Além disso, o fogo descontrolado também queimou rebrotas, reduzindo a produtividade em safras futuras.

Mas, como assim? Cada cana-de-açúcar plantada consegue rebrotar de cinco a seis vezes, o que significa que, em um mesmo canavial, o produtor consegue ter de cinco a seis safras. Com as perdas provocadas pelos incêndios, os agricultores foram obrigados a replantar mudas do zero ou terão menos safras com o mesmo plantio, aumentando os custos de produção. Em outras palavras, pode-se dizer que atear fogo ao canavial é o mesmo que queimar dinheiro.

A técnica de queima controlada é autorizada por lei, mas necessita de autorização prévia dos órgãos competentes para ser realizada. Caso contrário, configura-se crime ambiental, passível de multa e até prisão do infrator. Desde 2007, a partir da assinatura do Protocolo Agroambiental de São Paulo, o avanço da mecanização dos processos de colheita reduziu a prática em todo o território paulista.

Em dez anos, a área de queima de cana autorizada caiu 90%, segundo dados da própria Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo. Sancionada em agosto de 2024, a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo foi outra medida estratégica adotada como mecanismo para reduzir os casos de incêndios florestais.

Prejuízos

Em termos econômicos, as queimadas também têm impacto direto nos preços do etanol e do açúcar ao consumidor. Isso porque, como houve redução de produtividade, há menos oferta de matéria-prima para a indústria. Divulgada em setembro, uma pesquisa da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) aponta que, de junho a agosto, os incêndios causaram um prejuízo de R$ 14,7 bilhões, atingindo cerca de 2,8 milhões de hectares de propriedades rurais brasileiras. O levantamento considera os prejuízos com perda de matéria orgânica, produção, redução de produtividade, cercas em áreas de pastagem, potássio e fósforo nas camadas superficiais do solo.

Em posicionamento publicado na internet, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), entidade representativa das principais unidades produtoras de açúcar, etanol e bioeletricidade da região Centro-Sul do Brasil, afirma que o produtor rural está no centro da temática, mas não como o culpado e, sim, a principal vítima. E a desinformação, o seu maior algoz. “Usinas e fornecedores de cana-de-açúcar são vítimas dessas ocorrências e têm feito investimentos expressivos para proteger o canavial, que é seu maior ativo”.

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